19/07/11

Aprender a pensar

Este ano tenho por muitos momentos falado com colegas e amigos sobre o que é a Escola, e o que queremos da Escola, e o que aprendem as nossas criancas na Escola. 

E umas das coisas que eu retirei da Escola e que nunca me vou esquecer foi através de um "stôr" de Filosofia (décimo ano), no Liceu de Oeiras, ele era estagiário. E todos os bons alunos nessa cadeira foram apenas médios alunos. Tudo porque a única coisa que este professor pediu foi para nós esquecermos o que tinhamos decorado das outras disciplinas, porque nesta a única coisa que ele queria era que nós aprendessemos a pensar. Incrivel! E por muito que eu lesse o livro de textos nunca saí do 3. E no ano seguinte veio um outro professor de filosofia e aí era para "marrar"! O outro Professor foi um professor na Área das Pescas na Universidade do Algarve, que depois de eu ter usado uma fórmula me perguntou se a fórmula que eu usei teria erros, não porque eu a tivesse escrito mal, usado mal mas o investigador que a escreveu tivesse errado? E claro mais uma vez me deparei que nada é absolutamente errado!
E é isto que eu mais que tudo gostaria que o E. e a K. aprendessem. A pensar por eles. Que nada seja uma verdade absoluta que eu como mãe, ou o pai ou família ou na escola se venha com verdades absolutas.

A semana passada quando um jornalista norueguês entrevistava 2 criancas na Irlanda elas diziam que nunca poderião ser amigos de criancas católicas. E quando interrogados pelo porquê, a resposta foi porque os pais lhes tinham dito! Valha-nos...................................! Estas criancas não tinham 4 anos e meio como o E. E o E não me deixa escolher os amigos dele, isto é eu posso tentar manipulá-lo mas tenho que trabalhar muito com o caso! 

Tudo isto para dizer que adorei parte do texto que Eduardo Sá escreveu em Junho:
"(...)Afinal, para que serve a escola? Se a escola não serve para educar, para que serve a escola? Se a escola não serve para ajudar a pensar, para que serve a escola? Se a escola acarinha o repetir e castiga o recriar, para que serve a escola? 
Diante dum erro, ou o escutamos, e nos tornamos inteligentes, ou o iludimos, e ficamos estúpidos. Somos, portanto, sempre parte do problema e parte da solução. Constatar um problema e assumirmo-nos estranhos a ele só acontece quando o problema somos nós. Será assim com a escola como connosco. Mas, então, a educação deve tornar-nos todos, em relação a ela, parte do problema e parte da solução. Admito poder estar enganado, mas a escuta é o início da tolerância e a humildade o princípio da sabedoria. E, em relação à escola - de quem governa, a muitos pais e a alguns professores - tem faltado escuta e humildade.

Uma escola que considera o estudo acompanhado ou a área de projecto como luxo está, perigosamente, a deixar de sê-lo. Como deixa de o ser quando penaliza os «cabeças no ar» e incentiva os «cabeças no chão». Como deixa de o ser quando castiga os faladores (que é quem mais ela devia acarinhar). Como deixa de o ser quando cria mestres aos 23 e, antes de começarem a viver, espera que sejam ídolos, antes dos 30. Como deixa de o ser quando não percebe que as crianças que procuram, compulsivamente, o sucesso ou são deprimidas ou vivem assustadas. Como deixa de o ser quando não percebe que a contrapartida da sabedoria é o mistério (ou, se preferirem, o encantamento para com o invisível)."



Coligação de singularidades
Escrito por Eduardo Sá  (20 Junho 2011)
1. Gosto das cadernetas do aluno como um instrumento de comunicação entre a escola e os pais. Como uma forma de dizer às crianças que nada do que deve ser do conhecimento da família passa à margem da sua atenção e deixa de ser sufragado por ela. E servindo para recordar à escola que os pais delegam, com respeito, responsabilidades educativas ao cuidado da sabedoria dos professores. Já me custa que, vezes demais, a caderneta do aluno seja um muro de lamentações ou um rol de queixinhas. De parte a parte. Como se pais e professores, em vez de se educarem uns aos outros, comunicando os gestos de forma clara e expedita, fossem de lamento em lamento. E, mais do que reconhecerem dificuldades ou trocarem fórmulas educativas de sucesso, encontrassem na caderneta um libelo acusatório onde, quem redige, se excluiu de quaisquer responsabilidades pelas situações criadas por uma criança. Atribuir culpas sem reconhecer responsabilidades é configurar a caderneta do aluno como um tablóide sem função informativa e transformar uma criança num carteiro de queixinhas. As queixinhas nunca são um bom exemplo de sensatez para a educação de ninguém. E, embora haja quem as acarinhe e, até, estimule, são mais bullying do que pode parecer.
Ora, repete-se, muitas vezes, esta vertiginosa tentação para a queixinha da parte de todos os agentes educativos. Como se, em vez dum envolvimento conjunto e responsável, na procura de soluções inovadoras para a que a escola se torne num lugar melhor e mais bonito, todos parecessem mais ou menos dominados pelas experiências que terão tido na sua relação com ela. Afinal, quando os pais se insurgem, em surdina, contra alguns professores, ou depreciam (ao jantar) as respectivas qualidades, estão a educar os filhos para a sabedoria ou estarão a vingar-se, com anos de atraso, da escola que os maltratou e em que cresceram? Afinal, quando os professores esticam o dedo e, entre-dentes, acusam os pais, por tudo e por nada, estão a querer educar as crianças ou estarão a reconhecer neles muitas das omissões que, hoje, reconhecem nos seus? Afinal, para que serve a escola? Se a escola não serve para educar, para que serve a escola? Se a escola não serve para ajudar a pensar, para que serve a escola? Se a escola acarinha o repetir e castiga o recriar, para que serve a escola?

2.
Diante dum erro, ou o escutamos, e nos tornamos inteligentes, ou o iludimos, e ficamos estúpidos. Somos, portanto, sempre parte do problema e parte da solução. Constatar um problema e assumirmo-nos estranhos a ele só acontece quando o problema somos nós. Será assim com a escola como connosco. Mas, então, a educação deve tornar-nos todos, em relação a ela, parte do problema e parte da solução. Admito poder estar enganado, mas a escuta é o início da tolerância e a humildade o princípio da sabedoria. E, em relação à escola - de quem governa, a muitos pais e a alguns professores - tem faltado escuta e humildade.
Uma escola que considera o estudo acompanhado ou a área de projecto como luxo está, perigosamente, a deixar de sê-lo. Como deixa de o ser quando penaliza os «cabeças no ar» e incentiva os «cabeças no chão». Como deixa de o ser quando castiga os faladores (que é quem mais ela devia acarinhar). Como deixa de o ser quando cria mestres aos 23 e, antes de começarem a viver, espera que sejam ídolos, antes dos 30. Como deixa de o ser quando não percebe que as crianças que procuram, compulsivamente, o sucesso ou são deprimidas ou vivem assustadas. Como deixa de o ser quando não percebe que a contrapartida da sabedoria é o mistério (ou, se preferirem, o encantamento para com o invisível).

3.
Muitas vezes, alguns jornais, fazem de caderneta do aluno e, argumentos sensatos à parte, reproduzem queixinhas. Tem sido, infelizmente, um pouco assim a propósito da reformulação dos contratos de associação que o Governo determinou, a meio do ano lectivo, e da reacção a ela que colégios e associações de pais trouxeram para a rua. Começando pelo princípio, a educação não é um direito das crianças: é um imperativo para todos. Sendo assim, parece-me indiscutível o direito público à educação. Que o Estado, na douta prudência de quem desenha políticas e as configura, determine de que forma o ensino público e o privado podem conviver, será indispensável para que todos nos sintamos esclarecidos. Sendo certo que o direito público à educação tem de merecer critérios musculados de qualidade. Dou dois exemplos da forma como se fere o direito público à educação... Reformar o parque escolar das escolas públicas, tendo deixado que muitos dos seus professores mais qualificados a tenham abandonado, corre o risco de transformar uma reforma numa lipoaspiração. Ou permitir que nalgumas escolas privadas, com contrato de associação com o Estado, exista pó de arroz nos critérios de classificação, ou aceitar que, em relação a algumas crianças que a elas recorrem, haja reserva no direito de admissão, é uma afronta ao direito público de educação. O que está em causa é que o Estado deve ser quem define políticas, quem desenha formas de as executar, quem estima gastos, quem inspecciona e quem pune incumprimentos. Um mundo onde todos se educam a todos é um mundo novo. Longe da produção industrial de mestres e mais perto da humanidade sem a qual não nos tornamos pessoas. O outro só se torna pessoa quando passa a ser parte de nós.

4.
Torna-se, pois, urgente que, em vez de se instrumentalizarem crianças e campanhas políticas, e no lugar da contínua ausência de política educativa, haja um pacto de regime através do qual se assuma o que se quer da escola e da escolaridade das crianças. E que, queixinhas à parte, governo e oposição não sintam o diálogo e o compromisso como uma cedência mas como um exercício de sabedoria. Aliás, quando se multiplicam os estudos que elevam as carências das crianças que frequentam as escolas, chegou altura de sabermos se os diversos agentes educativos compreenderão que raciocinar significa pôr problemas e resolvê-los; ir da sensibilidade à palavra e passar das palavras para os actos; organizar um acto com princípio, meio e fim; e dar-lhe uma dimensão prática e empreendedora. Sem nunca esquecer, com Bach, que aprender é um efeito colateral da paixão.
No limite, não compreendo o que pode ter de chocante uma gestão autárquica ou, mesmo, privada da educação. Se, no limite, a gestão de meios for mais ágil e mais eficaz, se o envolvimento dos recursos humanos se tornar mais racional e mais acolhedor, se, com tudo isso, as inspecções forem rotinas que não sejam sentidas como um exercício batoteiro e oportunista mas como uma oportunidade formativa, não compreendo porque terá de ser o Estado patrão, em quaisquer circunstâncias, da educação. Aliás, aquilo que tem acontecido com algumas escolas privadas, com contratos de associação com o Estado - em locais onde os meios públicos, colocados ao serviço da educação, escasseiam - é um bom exemplo duma paz possível.
Entendo um sistema misto onde escolas privadas concorrem com escolas públicas, desde que os critérios de desempenho de umas e outras sejam rigorosos e transparentes. E desde que fique claro que, ensino privado à parte (onde os pais conhecem, à partida, os compromissos que uma opção como essa comportará) o acesso ao ensino (público ou privado, com contratos de associação com o Estado) será obrigatório e não encontrará entraves (a não ser, aqueles que estão previstos na Lei). Embora me pareça publicidade enganosa os rankings onde umas e outras são colocadas em paridade (quando, de facto, desde as condições de espaço, aos alunos a que se dedicam e aos problemas com que se defrontam sejam, em quase tudo, profundamente díspares).
Já sistemas onde as funções do ensino público, do ensino privado e do ensino privado com contrato de associação não são claros tornam-se amigos da demagogia. Será a escola pública capaz de acolher todos os alunos que, neste momento, se encontram abrangidos pelos contratos de associação que o Estado tem com algumas escolas privadas? Será razoável que haja escolas públicas com disponibilidade de acolhimento de alunos, mas sem recursos, a concorrerem, num mesmo local, com escolas privadas com contratos de associação? Serão os critérios de gestão de umas e de outras igualmente racionais e ponderados? Estarão todas as escolas privadas, com contrato de associação, a criar condições para um acesso mais justo ao ensino de todas as crianças ou existirão algumas que, a pretexto duma contestação, em nome dos alunos, vêem fugir oportunidades dum enriquecimento (moralmente) ilícito? Será justo que o Estado, sem definir previamente quaisquer critérios, pactue com alguns contratos de associação que poderão representar formas de acentuar discrepâncias no acesso à educação, pagas com o dinheiro de todos? E a reformulação dos contratos de associação, não devia ter sido anterior aos constrangimentos económicos que o Estado, agora, enfrenta, e não devia ser pautada por uma política educativa que integrasse as diversas respostas num todo articulado? E - vamos imaginar - que, por desleixo, foram concorrendo, em áreas adjacentes, ensino público e ensino privado, com contrato de associação, e que, num ou noutro caso, este último optimiza melhor os recursos e preste melhor serviço público? É critério que o Estado se refugie numa clivagem público/privado, penalizando a eficácia? Não é verdade que a clivagem entre a qualidade das escolas e dos professores não se mede pelo facto de serem ensino público, ensino privado e ensino privado com contrato de associação? Tem algum sentido tomar-se a escola como uma disputa político-partidária, onde os critérios se esgotem na disputa entre aqueles que são a favor da escola público e os que defendem o ensino privado? E será razoável que os candidatos presidenciais se deixem engolir por ela quando deviam ser quem mais exige que a educação seja uma razão de Estado e que, muito mais que a economia, seja ela quem define uma ideia de futuro? Estará algum partido em condições de reivindicar autoridade moral nesta discussão?

5.A Maria tem, hoje, 19 anos. Foi, como tantos outros adolescentes, uma aluna brilhante e, como muitos mais, entrou em Economia, com uma média quase... escandalosa. Ao fim do primeiro ano, com excelentes notas, a Maria assumiu aquilo que lhe ia zurzindo no coração. O seu sonho seria mudar de licenciatura e estudar... direcção de actores. É claro que toda a abertura que sentia nos pais, até aí, a propósito das suas opções profissionais, vacilou, por momentos. Mas a Maria, foi engenhosa e mudou de curso. Ao fim da primeira semana de aulas parecia mais ou menos tristonha. O alarme familiar soou e a Maria reconheceu que lhe tinham colocado uma tarefa... muito difícil. Na escola para onde entrara pediram-lhe para que, durante o fim-de-semana, descobrisse uma qualidade ou uma competência que achasse que só ela, e mais ninguém naquela escola, pudesses ter. Chegar com a língua ao nariz poderá chegar? - perguntou, para si. Seja como for, o importante para a sua escola seria que todos os alunos descobrissem as suas singularidades. Porque um local que não seja uma coligação de singularidades nunca será uma escola.

Ora, é aí que - suponho - todos queremos chegar. Criando uma escola com, diversos formatos, que convivam com regras claras. Tornando-nos todos, sem queixinhas, parte do problema e parte da solução. Com tolerância, com humildade e com paixão. Com respeito pela educação. Por amor à sabedoria e à liberdade.



retirado da Revista Pais e Filhos
pais e filhos

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